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Faculdade um produto cultural - Parte II

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Descubro então que a faculdade é coisa séria: posso ter no máximo oito faltas numa “matéria optativa”, mas já tenho dez. Falo com o professor que, envergonhado, pede desculpas por ter feito tantas chamadas. Dispõe-se, com a máxima boa vontade a me ajudar. Meu argumento são as notas de trabalhos e provas, já fui aprovado, tenho uma das maiores médias da turma. O professor não se impressiona com o paradoxo (alguém que não esteve presente para saber, mas tem todas as provas de que sabe).

Quinto período: Reparo que depois de três anos de estudos, vários alunos adquiriram um estranho vício: ir até a faculdade e voltar. Consiste em se dirigir até a escola, ficar alguns minutos andando pelas salas e corredores, tomar um café e voltar. Dessa volta esses alunos conseguem retirar um estranho, mas inquestionável prazer. Incluo-me entre eles. Mas ainda assim estou com todo o pique, quero fazer diferente nesse período; começo o semestre freqüentando palestras, seminários e mini-cursos para ter minhas 200 horas extracurriculares; devo ter umas 70 horas, falta pouco; Outra novidade nesse período é a formação da comissão de formatura. Três cargos muito concorridos que levantam questionamentos e propaga a discussão em várias aulas no decorrer do semestre. No final das contas é decidida pela “panelinha” dos alunos “puros-sangues” da faculdade - uma maioria de oito pessoas - quem deverá representar a turma, para a desilusão dos “transferidos”.

Nesse semestre uma nova professora nos chama a atenção, também conhecida como a professora das fichinhas. A professora carrega sempre uma pasta com um pequeno arquivo de plástico cheio de fichinhas. Sua aula consiste em transcrever o que está escrito nelas para o quadro. Nenhuma pergunta fora do que está escrito nas fichinhas pode ser feita. Um dia, ela esquecerá as fichinhas em algum lugar e não poderá dar aula.
Atualmente não sonho em mudar o mundo, nem em escrever o que penso; nem desmascarar o status quo, ou o capitalismo, ou mesmo combater a desigualdade social. Aprendi que devo manter-me cerceado por uma linguagem jornalística; que não devo emitir opinião; não devo tentar ser o advogado, nem a policia, nem o juiz, nem o quarto poder; aprendi também que devo respeitar o capitalismo, a linha editorial do veículo que eu trabalhar; aprendi ao longo de três anos a abrir aspas para os outros falarem; a ouvir todos os lados de um fato em cinco minutos; a escrever com medo da “faca” do editor; e se eu não for assim serei excluído do mercado de trabalho.

Estou feliz, mesmo assim. Pensei muito no meu Trabalho de Conclusão de Curso, como estive pensando no decorrer de todo o curso. Li tudo o que podia; porém não fiz bem o que eu pretendia no início do curso. Mas no final das contas o meu saldo ficou positivo na faculdade. Hoje fiz essa análise de um produto cultural “o ensino superior privado”. Pois essa é a minha experiência, minha forma empírica de demonstrar o que foi esses quatro anos de aprendizagem. Realmente queria ter feito diferente em alguns casos e em algumas circunstancias. No entanto não fiz, aprendi que quem faz a faculdade é, de certa forma, o próprio acadêmico.

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